quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Valsinha

-Que a gente tinha terminado.
-Por que você me fala uma coisa dessas?
-Ué, você que perguntou!
-Eu sei, mas você sabe que se eu soubesse que você tinha sonhado isso, eu ia preferir nem saber. Num devia ter falado!
-Mas se eu ficasse sem responder, você poderia achar que eu tava tentando esconder alguma coisa.
-Sonhos revelam o nosso inconsciente. Aquilo que a gente sente vontade de fazer e não faz por que não tem coragem. Por que você me contou isso?
-Por que você perguntou!! Eu não queria te ofender...
-Queria, sim! Você sabe quantas vezes eu já sonhei coisas e não te contei por que sabia que você não iria gostar??
-Não. Mas gostaria.
Isso ela não ouviu.
-... me responde assim, na lata. Poderia ter dito que não lembrava e ponto, e encerrava essa história...
-Por mim ela nem tinha começado.
-Você não pensa em mim, mesmo, né? A você só interessa os seus sonhos, o que você gostaria ou não de saber... Tô ficando cansada...
Silêncio
- Por que você não fala nada?
-Por que eu não tenho nada a dizer.
-Eu tô certa, então?
A voz dele embargou:
- Você que sabe.
- Você sempre joga a culpa para cima de mim. Gosta de me fazer me sentir culpada das coisas. Por que você faz isso? Foi você que começou!
-Sabe de uma coisa? Melhor a gente acabar tudo por aqui.
- Era o que você queria desde o início, né? Já tinha percebido há algum tempo, tem muitas menininhas atrás de você, mesmo. Bem que minha mãe avisou pra eu não confiar em você.
Fecham-se as cortinas. Fim do primeiro ato.

terça-feira, 20 de novembro de 2007

pelo avesso, assim

Sei não, mas parece que alguém morreu. A sensação de que se está meio fora dos quadros, meio diferente de todo mundo, meio pior que todo mundo, bem como a sensação de que um eu que existia cessou de existir. Sim, a vida tá aí com suas dificuldades e seu dia-a-dia e tudo faz parte, mas agora não é a hora de tentar se conformar. É um pouquinho do “mas só não me diga isso” da Via Láctea do Renato Russo por que havia algo ali que não está mais. Alguém levou. Criou pernas e andou. Desapareceu. Sumiu. E ainda tô meio assim, meio cão sem dono sem saber se quero chorar ou dormir, desistir ou tentar.
Depois passa. Como sempre.

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

ritos de passagem, sarcasmo e reencarnação


Eu era bem pequeno e meu primo André vivia na casa do meu avô. Lembro que estávamos em cima da cama vendo tevê e ele me mostrou a revista. Devia ser um sábado. Até então, para mim, os únicos quadrinho que prestavam eram os da turma da Mônica, em particular os do Chico Bento. Lembro que achei a coisa meio desorganizada, sem sentido. Coisa dos grandes. [Quando eu era criança existia essa demarcação social. Os pequenos e os grandes. No meu prédio tinha dois parquinhos pra gente brincar: o dos pequenos (com aquelas casinhas coloridas de madeira e vários outros brinquedos, que nós chamávamos de ‘casinha do Tarzan’ sabe-se lá por quê) e o dos grandes (que tinha o popular trepa-trepa, que nós chamávamos de ‘Aranha’ e mais uns dois balanços para crianças maiores)].
O tempo passou e minha irmã fazia um tratamento dentário que além do uso de aparelhos previa consultas a uma fonoaudióloga. Eu já adentrava a nova geração dos ‘grandes’ (usuário, portanto, do outro parquinho) quando, numa sala de espera da dita fonoaudióloga, resolvi escrever mais um capítulo da minha iniciação. Debaixo da mesinha que separava as duas poltronas onde eu e minha mãe esperávamos minha irmã, havia vários números da revista. Mad. E daí que não havia organização ou sentido? E daí que o guri banguela e sardento da capa não aparecia em nenhuma das histórias? Descobri com orgulho que eu já era um dos grandes. Já conseguia entender e achar graça daquilo tudo. Tinha sátiras de programas de tevê, de filmes, spy vs spy e, o mais sensacional, as dobradinhas da última página. Só quem viu, sabe o que era. Além de me catapultar ao mundo dos grandes, graças a revista MAD o sarcasmo e a ironia passaram a fazer parte da minha visão de mundo. Pensando bem, não foi só o fato de ter sido um lord maçom inglês na outra encarnação que me fez assim tão maldito. As revistas MAD também contribuíram bastante. Ouvi dizer que estavam sendo publicada pela Panini , mas tentei encontrá-las em algumas bancas da cidade esta semana e não encontrei. Continuarei a procurar. Se achar, divido com vocês algumas pérolas.

domingo, 14 de outubro de 2007

Despretensão

Faz tempo que não escrevo nada. São épocas em que a vida objetiva reclama mais tempo do que a vida subjetiva. Não sei se “tempo” é bem a palavra. Por que comigo ambas as vidas andam grudadas em mim. Muitos problemas burocráticos para resolver, o “muito do que não se gosta” em nome do “pouco que se gosta”. Lendo o blog do Fernando Meirelles sobre blindness voltei a sonhar em ser diretor de cinema. Acho que hoje em dia, não sonho mais isso sozinho. O número de pessoas querendo ser dirigidas ainda é alto, mas o número daqueles que querem o 1º Oscar brasileiro pro seu filme vem aumentando. Eu nem faço muita questão de Oscar, não. Os americanos que se deleitem com os seus melhores do mundo, que há muito tempo já não são os melhores do meu. É sério, odeio isso. Lembro que um dia eles tiveram a pretensão de eleger Robin Williams o cara mais engraçado do mundo. Não que ele não seja engraçado, mas daí a ele ser o mais do mundo é um pouco demais. (será que existe isso? Uma pessoa mais engraçada do mundo?). Além do mais, falaram em nome do mundo sem perguntar o meu voto. Perguntaram o seu?
Deixando picuinhas irrelevantes de lado e voltando ao início, dar mais tempo à minha vida subjetiva seria algo como ser um diretor de cinema e tal... Pode não fazer muito sentido para você, falar deste tipo de dicotomia na vida de uma pessoa (se não fizer, você é uma pessoa de sorte, lembre-se disso), mas escrever aqui é um pouco viver subjetivamente. Ser um diretor de cinema (de uma forma meio capenga, mas sê-lo).Terapia. Uma válvula de escape para as minhas frustrações. Mesmo que você, meu pretenso leitor não exista, que esta seja uma mensagem na garrafa destinada a boiar indefinidamente neste mar de virtualidade, tá valendo! O que importa, no fim, foi, de alguma forma, ter me sentido direitor de cinema.

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

desejo

Quero alguma coisa que mude minha vida. Assim, de repente. Abrindo o e-mail e dando de cara com A Revelação. Sei lá, um texto que me faça pensar, me faça sentir que existem coisas surpreendentes pelas quais valem a pena se surpreender. Quem sabe um remédio, ou algum veneno antimonotonia. Não. Nada muito óbvio, não, até por que são as coisas óbvias as que mais me intrigam na sua complexa simplicidade. Algo além do trivial que atinja jurisdições de mim até então de ferro de pedra. Tal qual água. Tal qual fogo. Nem quente nem morno nem frio nem insosso. Algo. Que não sei, mas que só de escrever essas palavras já obtive.
Estou com sono.
Vou dormir.


boanoite.

sexta-feira, 20 de julho de 2007

TUDO POR UM LIVRO DE AUTO AJUDA

Tem sido difícil. Preciso de poesia. Descubra onde dói, doutor, por que eu já não ando querendo saber de nada! Preciso de um livro de auto-ajuda. Preciso de poesia que me encante como a música para a bailarina da caixinha de música. Só para sair desse compasso. Desse andar em círculo. Desse correr atrás do próprio rabo. Que rabo? À essa altura nem mais rabo há. Há breu. Frio. Vítima. Algoz que me fita da fotografia preto-e-branca. Mofada.(e o presente é tão fugaz que só o passado me anima). Não quero nada com o futuro.

terça-feira, 1 de maio de 2007

tetris




As coisas estão se ecaixando. Sedimentando. Ao calor do sol e à brisa polenizadora, por sobre rochas em areia, um novo solo vai nascendo e os de baixo servem pra fundamentar a sua história.
Estou como um jogo de tetris.

quinta-feira, 26 de abril de 2007

(pensando)

O maior estratagema do Imponderável é nos provocar o enigma de existir.

O tempo linear é uma ilusão.




(ajudou?)

quarta-feira, 25 de abril de 2007

ESPELHO

A minha fé é abalável.Todos os dias quero extrapolar os limites do meu corpo. Nirvana.
Toda vez que me forço à exatidão o Imponderável me arrebata(a distância entre 1 e 2 é infinita!)e toda conclusão que me ocorre é que tudo á nada e nada é tudo. e não há nenhum sofisma nisso
.há beleza.

Grande beleza de só vermos o presente
enquanto o passado se esvai por nossas mãos
e o futuro não é nada além de escuridão
(não me levem a MAL)
e nesse hiato entre esperança e recordação
a nossa vida se sobressalta e num impulso salta:

!O NOSSO CORAÇÃO!

ãoãoão
razão e fé
paradoxo ou não
moeda sem faces eu e eu mesmo aqui e agora?
Só me me resta sinceridade.

oco

Estranho ser oco e não ver nada além do trivial.
Esses dias automáticos.
Lá ai uma musiquinha:

Sou palhaço do circo sem futuro
Um sorriso pintado a noite inteira
O cinema do fogo
Numa tarde embalada de poeira
Circo pegando fogo
Circo pegando fogo
Circo pegando fogo
Circo
(Palhaçada)
Sou palhaço do circo sem futuro
Um sorriso pintado a noite inteira
O cinema do fogo
Numa tarde embalada de poeira
Circo pegando fogo
Circo pegando fogo
Circo pegando fogo
Circo
(Palhaçada)
E a lona rasgada no alto
No globo os artistas da morte
E essa tragédia que é viver, e essa tragédia
Tanto amor que fere e cansa

(palhaço do circo sem futuro)
(Cordel)

domingo, 15 de abril de 2007

A paz

Um pouco sobre o que eu escrevi embaixo. Acho que eu me canso de mim às vezes. Me faço muitas perguntas e espero de mim determinadas atitudes que nem sempre estou disposto a ter, por motivos que a minha racionalidade ignora. Não sei se trata de alguma patologia psiquiátrica, pode até ser, mas é que de repente perceber que eu não preciso ter todas as respostas pra mim e muito menos agir como espero 24 horas por dia me deu um pouco de paz.

sábado, 14 de abril de 2007

,o cotidiano mata o sentimento da gente

Estou com vontade de ver um filme. Não sei bem qual ainda, mas me deu uma vontade agora. Michel Gondry. Spike Jonze. Charlie Kauffman. Algo assim. Já está um pouco tarde, as locadoras já devem estar fechadas e talvez a TV a cabo possa ajudar de alguma forma. Ontem quando eu cheguei estava passando Colateral. Gosto principalmente da fotografia desse. Mas eu tava meio cansado e já tava tarde também. Desliguei na hora que apareceu o negão tocando trompete. Aquele que o Tom Cruise mata logo depois.
Sei lá, mas hoje eu tava a fim de ver um filme que mexesse de alguma forma comigo. Queria sair um pouco também, mas nem dá. Ontem teve um show e tinha tempo que eu não fazia algo parecido. Parecia que eu tava lembrando de alguma coisa que eu tinha esquecido. Foi bom. O cotidiano mata o sentimento da gente, daí de vez quando ele tem que nascer de novo. O problema está na erraticidade. Entre a morte e o nascimento. A gente fica com grandes chances de perder o fio da Grande Meada.

quinta-feira, 8 de março de 2007

A hora da aurora

Após atravessar a rua, não se lembrava se havia sido atropelado, ou não. Ficou vagando procurando indícios de que estava vivo.

sábado, 3 de fevereiro de 2007

Ser de si

Não é porque estamos sós, somos de nós. Ser de si é algo bastante complicado nos dias atuais. É andar na corda bamba. Quem é de si nunca se anuncia, por isso fica difícil saber e tentar alguma entrevista até por que quem é de si, quando ordinário, qual seja, com alguma nesga de orgulho, não tem muito apreço em revelar seus segredos (o extraordinário, é tão raro que muitos pensam que não existe, mas existe. E brada seus segredos aos quatro ventos que tiverem ouvidos de ouvir. Geralmente não é escutado por aqueles que dizem querer tanto saber A Resposta -vejam só, fazem pouco caso do extraordinário).Essa solidão, que no meio de tantos nos faz únicos, enquanto não nos decidamos braviamente a equilibrarmo-nos na corda bamba, nos esconde de nós mesmos perversamente com os ardis mais tolos e infames. Sozinhos, corremos o risco de escolher (e as mais das vezes, escolhemos) os caminhos de outros que não são de si e formamos uma massa amorfa, uniforme onde ninguém é de ninguém se deslocando a lugar algum. Pode ser que de tanto escolher dessa forma meio torta, quase que por omissão, algumas coisas comecem a doer em nossos corações onde adormece o si-que-que-não-é-de-si para que ele, talvez, comece a ser. É tudo tão incerto nessa vida que pode ser que nada disso aconteça e que talvez isso leve milênios sem fim. Inlcuindo os que não acreditam nessas crendices otimistas de reencarnação.

segunda-feira, 29 de janeiro de 2007

conflito

Algum tipo de ordem é preciso. Disciplina. É o que me ocorre quando é o que menos desejo. Há em mim uma imensa vontade de letargia. Dormir toda a noite e também o dia. Mas ao mesmo tempo tudo isso me dá dor de cabeça e repudio. Sei que não é assim o caminho para mim.

CALOR

De volta Rio nesse calor infernal que me deixa irritado e com dor de cabeça.

quarta-feira, 24 de janeiro de 2007

Estrangeiro que pertence

Cheguei em São Paulo ontem. Parece legal.

domingo, 21 de janeiro de 2007

To the lighthouse

Nunca li nada da Virginia Woolf. Da vida e obra dela só sei muito pouco a mais do que foi mostrado no filme "As horas". Sei que, entre os livros que ela publicou, está "Rumo ao Farol" cujo título em inglês batiza esse post. Lembro que, há uns três anos atrás o jornal O Globo lançou alguns clássicos da Literatura Universal e que, semanalmente, aos Domingos, saía, no Segundo Caderno, uma crítica literária a respeito do livro que seria lançado na semana seguinte. Em relação a este livro, dizia-se que, salvo engano, e honrando a sagrada preguiça de pesquisar um pouquinho sobre o assunto, o livro não tratava da vida de um faroleiro, conforme o título poderia levar a crer, mas de pessoas em busca de um rumo. O título era simbólico. Adoro símbolos, e pelo mesmo motivo simpatizei com este cenário para acolher meus escritos. Essa minha mensagem na garrafa virtual tão displiscentemente chamada BLOG (quase uma onomatopéia). Os mais críticos podem gritar o paradoxo de que se encontra eivado o título. Não se pode voar solto quando se busca um rumo. Mas afirmo: Não vôo solto mas busco um rumo, vôo solto e busco um rumo.

terça-feira, 16 de janeiro de 2007

FILME: FONTE DA VIDA

Eu entendi como um filme que trata não da morte, mas da forma como lidamos com ela. Aliás, o filme deixa bastante claro algo que parece que não temos consciência no dia-a-dia. A morte é inevitável. Partindo-se desse pressuposto, o filme explora a forma como nos apegamos à pessoas, situações e sentimentos sem muita sabedoria, uma vez que outras grandes certezas da vida são que ela é mutável e existem muitas variáveis que não dependem da nossa vontade.
O filme apresenta três situações envolvendo dois atores, a meu ver, interpretando quatro papéis (dois personagens cada). A primeira situação mostrada passa-se na Idade Média. Rainha Isabel de Espanha (Rachel Weisz) manda o conquistador Tomás (Hugh Jackman) às terras Maias em busca de uma árvore lendária cuja seiva proporcionaria vida eterna àquele que a sorvesse. Se não me engano, há alguma menção no diálogo envolvendo os dois personagens sobre uma possível doença fatal que estaria acometendo a rainha, que desta forma, dependeria da missão de Tomás para sobreviver. A tal árvore seria remanescente da Criação do Mundo. Segundo explicação da Rainha em dado momento do filme, no Éden existiam duas árvores a da sabedoria, responsável pelo conhecimento do bem e do mal, e a da vida, responsável pela imortalidade. Quando Adão e Eva foram expulsos do Paraíso Deus retirou do mundo a primeira, deixando somente a segunda, que estava em poder dos Maias.
A segunda situação passa-se nos dias atuais. O médico Tommy (Jackman) dedica-se à pesquisas ligadas a cura do câncer enquanto sua esposa, a jovem e bela escritora Izzy (Weisz) padece em estado terminal desta doença. Tommy se utiliza em suas pesquisas de substâncias encontradas numa certa árvore na América Central obtendo resultados estupendos em testes feitos com cobaias, mas não chega a conseguir utilizá-las em Izzy, tendo em vista que esta perece antes, deixando um livro incompleto para que o marido termine. O livro chama-se “Fonte da Vida”, que conta a história da Rainha Isabel e do Conquistador Tomás.
A terceira situação passa-se em um futuro distante em que Tom (Jackman) viaja pelo espaço junto a velha árvore dentro de uma esfera de vidro, ou algo que o valha, em direção à nebulosa de Shibalba, onde os Maias acreditavam ser o destino dos seus mortos.
Na minha humilde opinião Tommy e Izzy são reencarnações de Tomás e Isabel e Tom é Tommy que adquiriu a imortalidade de seu corpo com a utilização da seiva da tal árvore da América Central, a tal árvore da Vida. Daí, por isso que discordo do que muita gente escreveu que eram personagens diferentes. Há diversos sinais de que Tom é um futuro de Tommy. Já a questão de Tommy ser uma reencarnação de Tomás, fica menos evidente, conforme dito, modificando-se ao sabor das diferentes interpretações.
Conforme vocês podem perceber as histórias se entrelaçam em inúmeros pontos em comum. Árvore da vida, morte, busca, apego. São elementos presentes em todas as tramas. Como ecos ou rimas, como alguns preferem dizer. Inclusive com planos semelhantes em algumas passagens. O filme nos narra o ponto de vista dos personagens de Jackman, impregnado de apego e temor da morte. O contraponto é a grande mensagem que, julgo, seja aquela que o filme busca comunicar e que, a certa altura da projeção, é encarnada pela personagem Izzy. O filme não entra nos méritos sobre o que acontece depois da morte, mas com uma poesia e um lirismo invejáveis, nos sugere qual deve ser o nosso comportamento em relação a ela tendo em vista que faz parte da natureza. Em certa altura Izzy explica maravilhada a Tommy que Shibalba é uma estrela que está prestes a morrer e demonstra espanto ao perceber que uma civilização tenha escolhido uma estrela às portas da morte como lugar para seus mortos. Mas depois ela descobre que da morte de Shibalba originar-se-á uma outra estrela, concebendo-se assim a idéia de que a morte também é um ato de criação. E se Izzy, a princípio demonstra-se assustada diante do breve fim de sua existência, um pouco antes de sua morte, em um dos momentos mais emocionantes do filme, diz a Tommy desprendida e sinceramente “Eu não tenho mais medo”, para total desespero deste, que em sua viagem astral rumo a Shibalba dali a pelo menos mil anos (quem sabe?), é ainda atormentado pelas lembranças da falecida esposa e do livro que havia se comprometido em terminar. A toda hora Izzy lhe aparece sussurrando “Termine” a o que ele responde angustiosamente da mesma forma como respondeu pela primeira vez “mas eu não sei como”.
Eis que vagarosamente, em um espetáculo visual fascinante, a esfera de vidro com Tom e a árvore adentram na nebulosa. Assim sendo, a árvore, que alimenta a imortalidade de Tom, morre e este, então, compreende a mensagem por trás do sussurro insistente de sua mulher. “Temine” era um estímulo a que ele também se rendesse à finitude. A o que ele acata. O que se segue daí são, segundo minha interpretação, conjecturas mentais de Tom sobre como se desencadeariam estas histórias se esta finitude fosse aceita por ele desde o início. Tomás, que morrera em um embate com um guerreiro Maia cumpre sua missão alcançando a Árvore da Vida. O desfecho desta conjectura é de um simbolismo belíssimo de se ver. Tomás, embevecido pelos efeitos da seiva milagrosa nos ferimentos que carregava das batalhas que travara, sorve-a em fartos goles e dentro de instantes, entre espasmos e estertores todo seu corpo se espoca em flor. Tommy, em vez de debater-se amargamente pelo inconformismo que o levara a tatuar alianças por todo seu corpo, aceita a morte de sua mulher e prossegue sua vida menos amargurado. E Tom? Tom termina. Serenamente.

segunda-feira, 8 de janeiro de 2007

notivagando

A noite lá fora avança para a madrugada. Julgo ouvir um ruído semelhante ao de uma cigarra. Cigarras cantam duas e meia da manhã? Percebo que só agora minha taxa de pensamentos por segundo ensaia voltar à escala normal. Tem dias que é assim. Simplesmente uma descarga de pensamentos sucessivos dispara adrenalina no meu sangue e eu fico afoito, aflito. Tenho, então, de procurar mil coisas para dar vazão a este impulso que nem sempre são coincidentes. Ler, ver televisão, falar besteira ou sobre a insustentável leveza do ser. Agora dedico-me a ultima etapa dessas atividades massivas a que me submeto sem saber muito bem a razão. Escrevo em vez de falar. Sobre isso e mais um pouco. Hoje pensei em escrever um conto. Vejo personagens a todo tempo. Chegou a haver uma inspiração, mas logo fugiu. E no estágio em que estou com as coisas, não haverá muita atenção disponível para as minudências de caracteres para descrever as pessoas que existem cá dentro e que percebo aí fora.As taxas estão voltando ao seu padrão. Além disso, percebo que retorno das fantasias que, louco, extrapolo de fazer sobre mim mesmo. Encontro meu corpo e meus dedos saltitando sobre as teclinhas do computador e todo um universo que, nas mais das vezes, malbarato com ilusionismos vãos. A vida é de uma simplicidade ostensiva, mas teimo em não ver. Percebo os motivos, as razões, velhas companheiras que ainda me assombram. Mapeá-las a minha mais árdua tarefa nesses últimos tempos. É uma coisa como que transcendente e imanente o que vivo agora (há esgares ainda na minha consciência, como que espasmos da imaginação delirante). Um retorno à minha realidade crística em crise enquanto as cigarras parecem prosseguir seu ininterrupto concerto. Um pouco irritante. Já são três da manhã. Devo ir dormir