quinta-feira, 22 de maio de 2008

futebol

Existe um momento especial nas nossas vidas em que passamos a entender coisas que não entendíamos antes. Como num passe de mágica, tudo o que não fazia sentido para a gente, passa a fazer. Deve ter algo a ver com crescer, amadurecer, passar a ter aptidão de manipular recursos mentais (razão e emoção) que simplesmente inexistiam antes, ou existiam mas gozavam de uma intocabilidade virginal que, por algum motivo que ignoramos, se auto-viola e segue avante. Que seja, a nossa vida passa a ser mais completa (e complexa, até) depois disso e, por isso mesmo, mais interessante.
Ontem aconteceu isso comigo nesse jogo Fluminense X São Paulo pela Libertadores. Quem me conhece sabe, ou melhor, tem convicção do meu analfabetismo futebolístico. Tudo bem que eu sei o que é impedimento, mas isso só porque entendo que o jogo tem que ser minimamente justo. Agora não me pergunte quando ocorre o escanteio, por que o goleiro ora lança a bola da grande área, ora da pequena (o que é mesmo aquela meia-lua depois da grande área??) e muito menos (temeridade das temeridades, eu sei) a escalação do meu time (sim, agora estou sentindo vergonha de mim, mas já estou sabendo muito bem quem é Washington e Dodô, pelo menos -assim como os pobres são-paulinos).
Eu sempre fui a jogo de futebol no Maracanã desde pequeno com meu pai, mas nunca me empolguei muito, para frustração dele, um inveterado espectador que era capaz de saber a quantas anda a liga afro-asiática de futebol de várzea. Gostava de ir ao estádio mais para ver a festa das pessoas do que pelo jogo, em si. Lembro de algumas vezes sair gol e eu só me dar conta com o grito da torcida, de tão distraído que estava.
A crítica que fazia, continua valendo. É só um bando de homens correndo atrás de uma bola por 90 minutos, com um intervalo no meio. O Armando Nogueira foi além dizendo uma vez que, na maioria dos casos, futebol era um bando de milionários que se reuniam para bater uma bolinha. O futebol é, sim, irrelevante. Mas todas essas críticas são racionais. Ontem eu pude perceber a magia do futebol e tive a nítida percepção de que mesmo que o Fluminense tivesse perdido, eu teria gostado da mesma forma. A beleza do futebol não está na mecânica pura e simples de táticas e movimentos, mas nas infinitas possibilidades, na intrepidez e criatividade dos jogadores que, muitas vezes, são como autores de bons livros inventando soluções criativas para suas histórias. Quando você acha que o mocinho não vai se safar, ele sempre dá um jeito que não nos tinha acudido à cabeça, quando você acha que o jogador não vai se safar, ele inventa um drible que você não quer nem saber de onde ele tirou e como ele conseguiu fazer e vibra junto com a torcida.
Falando em torcedores, muitos deles exageram, sim. É inconcebível que pessoas se matem só porque torcem por times diferentes, mas a festa que se faz quando o time ganha um jogo como o de ontem, passam meses e ela ainda fica encravada na retina. Outro problema também são as reações explosivas e a tensão emocional que os torcedores acumulam vendo um jogo, responsáveis por enfartos e outras complicações de saúde. Quando ultrapassam-se estas fronteiras, está claro que o futebol deixou de ser o que nasceu para ser, uma diversão, e passou a ser sintoma de alguma doença. Não é preciso ser psicólogo para entender as transferências emocionais de que o futebol pode ser vítima.
Eu achava também que não gostar de futebol era sinal de personalidade forte, não se deixar influenciar pelo meio, remar um pouquinho contra a maré. Pode até ser, mas é uma tolice. Existem outras formas mais eficientes e relevantes de se remar contra a maré. Ontem percebi o quanto não é só por que todo mundo gosta que todo mundo gosta, mas por que é bem legal, mesmo.
Passar por isso tudo é um pouco catártico. Como muitos sabem meu pai faleceu faz um tempinho. Sempre me senti um pouco frustrado e até diminuído por não conseguir gostar de futebol e achava que meu pai se importava com isso também. Conseguir gostar de futebol foi meio que “uma conquista”, meio que me sentir amado pelo meu pai. Não que eu tivesse dúvida do amor dele, mas é fato que essa coisa do futebol era difícil pra ele. Não o culpo, coisa de pai. É muito bonito ver os pais levando os filhos ao jogo. É um momento de intimidade dos dois, em que eles podem se divertir juntos e se aproximarem mais e ontem vi isso com mais clareza e foi um pouco triste por ter me dado conta disso um pouco tarde demais, mas antes tarde do que nunca. Quando eu tiver um filho, vou levá-lo ao Maracanã!

quinta-feira, 8 de maio de 2008

[ballet]

Eu sou uma bola de neve. A cada metro andado, me guardo, me acumulo. De mim e do mundo. E me desfaço. E me refaço. Frágil e perseverante. Daquilo que fui muito ontem, pouco me restou senão a vontade de me libertar e andar. Tudo muito quase automático, muito quase consciente. Tênue fronteira que me constringe a não ser o que não sou.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

A realidade é o 18º camelo

Por Agência EFE

Nem as cores existem na natureza nem nossa mente reflete fielmente os que nos rodeia. A realidade é proporcional ao número de seres humanos, posto que o que cada um percebe é filtrado e deformado pelos sentidos objetivos e a mente subjetiva.
O mundo visual que nos rodeia é uma ilusão? É verdade que as cores não existem na natureza? Nosso cérebro reflete fielmente a realidade exterior? As respostas a essas perguntas demonstram que a realidade é um conceito bastante subjetivo, já que muitas das coisas que observamos não existem ou, pelo menos, não são como as enxergamos.
O coquetel de estímulos provenientes do interior e do exterior de nosso corpo e que captamos por meio dos cinco sentidos varia sutilmente de uma pessoa para outra, já que a estrutura, as diferenças e as alterações dos órgãos sensoriais de cada um fazem com que, por exemplo, vejamos e escutemos de forma diferente, tanto que não exitem duas percepções iguais do real.
Se essa percepção objetiva, por sua vez, é alterada pela interpretação subjetiva do que somos, acontece e nos rodeia, com base em nossa bagagem de aprendizados e experiências, podemos concluir que a realidade é algo tão pessoal e único como as impressões digitais.
Segundo o neurocientista Francisco J. Rubia, autor do livro "¿Qué sabes de tu cerebro?" ("O que seu cérebro sabe"), "antigamente se achava que o cérebro refletia de forma fidedigna o mundo exterior, mas, a cada dia, parece mais evidente que o cérebro é um mundo fechado que traduz os estímulos externos para a linguagem disponibilizada pelas estruturas cerebrais, dando uma versão interna ou uma representação da realidade exterior".

O mundo visual é uma ilusão?
É o que parece. As imagens, que se formam nas duas retinas dos olhos, são distorcidas, pequenas e invertidas. Além disso, o poder de resolução do olho é limitado e disforme, já que, fora do ponto de maior acuidade, é baixo e a retina é praticamente cega para as cores.
O olho, além disso, se movimenta constantemente de um ponto para outro do campo visual, de três a quatro vezes por segundo, o que faz o órgão criar um montão de novas imagens.
Por outro lado, é conhecida a importância da atenção para a percepção de qualquer sensação: por exemplo, se não temos atenção, não vemos.
Além disso, o cérebro "completa" a percepção das coisas que não são vistas, como a visão de um cachorro inteiro atrás de uma cerca, embora só vejamos partes do animal.
Mas, talvez o mais importante, seja constatar que muitas das coisas que vemos são criações do cérebro. As chamadas "ilusões óticas" são inúmeras e dizem "a gritos que o cérebro vê o que quer ver, por isso somos incapazes de captar o que costumamos chamar de 'realidade'".
As cores não existem. A natureza não tem mais que diferentes comprimentos de onda. A audição, a visão, a percepção da cor ou do som... Tudo depende do nosso cérebro e da organização espacial das estruturas que processam esses estímulos.
Além disso, o processamento cerebral das características ou propriedades dos diferentes estímulos do ambiente, como a qualidade, a intensidade, sua estrutura temporária e local de procedência, podem variar, devido às estruturas e células nervosas que os recebem e transportam.
Na visão cromática, intervêm receptores que captam os diferentes comprimentos de onda do espectro electromagnético (azul-violeta, verde, e amarelo-vermelho) e células que produzem as sensação de contraste entre as cores.
No final de todo o processo, o cérebro atribui uma determinada cor à atividade dos receptores e de todas as células que há até a informação chegar a um região denominada córtex visual. Mas um comprimento de onda não se transforma no cérebro em uma determinada cor. Não há uma correlação clara entre as duas coisas.

Presos dentro de nós mesmos
Nosso cérebro, então, reflete a realidade exterior? Para Rubia, esta pergunta tem um categórico "NÃO" como resposta.
"Existe uma realidade exterior, mas tudo o que vemos, ouvimos, cheiramos, sentimos está dentro de nós mesmos. É o próprio cérebro que está sempre falando com a gente", destaca.
Segundo o cientista, "graças às transformações que os receptores dos estímulos externos realizam, graças à tradução dos estímulos físicos para a linguagem cerebral dos impulsos nervosos, fazemos com que surja essa realidade, esse mundo que não está fora, mas dentro do cérebro".
A tradução deve ser boa, porque, caso contrário, não teríamos nos adaptado tão satisfatoriamente ao nosso entorno. Porém, estamos presos dentro do nosso cérebro, e qualquer pensamento sobre a captação da realidade é pura ilusão, diz o especialista.


Omar Segura

(retirado de: http://br.noticias.yahoo.com/s/080502/48/gjn2li.html)

quinta-feira, 1 de maio de 2008

epistolar

1: Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o símbalo que tine.
2: E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria.
3: E ainda que distribuísse toda a minha fortuna para sustento dos pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, e não tivesse amor, nada disso me aproveitaria.
4: O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece.
5: Não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal;
6: Não folga com a injustiça, mas folga com a verdade;
7: Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.
8: O amor nunca falha; mas havendo profecias, serão aniquiladas; havendo línguas, cessarão; havendo ciência, desaparecerá;
9: Porque, em parte, conhecemos, e em parte profetizamos;
10: Mas, quando vier o que é perfeito, então o que o é em parte será aniquilado.
11: Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino, discorria como menino, mas, logo que cheguei a ser homem, acabei com as coisas de menino.
12: Porque agora vemos por espelho em enigma, mas então veremos face a face; agora conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido.
13: Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três, mas o maior destes é o amor.

S. Paulo, I CORÍNTIOS 13.


***

“A religião se preocupa tanto com o pecado original que olvidou-se da pureza original” é uma frase que os roteiristas de “Irmão sol, irmã lua” colocaram na boca do Papa Inocêncio III em seu diálogo com São Francisco de Assis. Pouco me importa se assim foi ou não, o que me importa é que falar em religião causa curto-circuito em muitas cabeças, quando na verdade, deve ser somente uma proposta de ver o mundo através da ótica do Amor. Lobotomia, cauterização cerebral. É o que já me disseram a respeito dos métodos desse malfadado instituto, mas o que mais me espanta é que quem assim acusa, serve a algum tipo de convicção que igualmente lobotomiza e cauteriza e que, por muito pouco, não pode ser chamada de religião. Não experimentaram sentimentos que eu, religioso que sou, já experimentei. Certamente que igualmente eu me privo também de certos afazeres, mas religião e convicção são, no final das contas, escolhas, e em toda escolha há caminhos que devem ser deixados para trás.
Mas não há grandes diferenças entre não-religiosos e eu. Sei que tem dias em que estou menos religioso que eles e isso é confortante, não por gosto de vê-los submetidos aos meus caprichos (vendo-os vencidos pela religiosidade), mas por identificá-los como iguais, por que nessas ocasiões também eu estou submetido aos caprichos deles (vendo-me vencido pela não-religiosidade).
A religião, para mim, é a linguagem do Amor. Nos ligamos a Deus (Todo Amor) por ela. Nos unimos ao Todo através dela.