sábado, 30 de agosto de 2008

Não facilite com a palavra amor


Ah, o amor. Coisa mais formidável não há. Fugidio, arredio, arisco. Tem vezes que vai e vem, tem vezes que vem e fica, tem vezes que vai e nunca mais. Se conseguirmos capturá-lo, é recomendável segurá-lo firme. Se quisermos mantê-lo, é de bom grado termos fôlego para ir do agudo ao grave e do grave ao agudo sem perder o tom. É um pouco como malabares com bolas coloridas, tanto pela acrobacia, quanto pela beleza, como também pelo frio na barriga que dá.
Não é dado a convenções, regras. Da maneira mais admirável manda tudo às favas. O único totalitarismo que reconhece é o de querer bem, pois quanto mais se tenta submetê-lo, menos ele está presente. Pode-se dizer que nasce como um acidente, mas cresce como uma sequóia.
Dos únicos que detêm o truque de manipular o tempo. Faz momentos eternos durarem um milésimo de segundo e um milésimo de segundo durarem uma eternidade. Ficamos desapontados quando vimos que já passou, mas quando está passando parece que é para sempre.
Amor em inglês é feminino. Os ingleses sabem das coisas, mas o amor é temperamental como uma dama francesa. Uma rainha. Uma fada.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

... o acaso é amigo do meu coração, quando fala comigo, quando eu sei ouvir...

Dentro do meu peito mora um anjo caído. Se sou imperfeito, se tropeço, se me machuco, é por causa dele. Ele me mostra limites quando acho que posso voar. Se insisto, ele corta suas próprias asas com as unhas, como uma águia velha arranca seu próprio bico. É uma espécie de prova de cumplicidade.
Junto com alguns pequenos demônios percussionistas, dá o compasso da música da minha vida. Tum dum. E assim acordo, e assim como, e assim vivo e assim durmo, e assim, sempre. Tum dum. Por que a vida é algo de harmonia entre anjos e demônios. Nem que seja somente neste compasso que nos acompanha, até a morte, quando nos definimos.
De igual maneira, ele me tira do sarcófago se eu mesmo me mumifiquei. Ele me mostra Mozart. Ele me mostra Beethoven. Ele me apresenta Shakespeare. Ele me leva ao alto de mim mesmo (quando eu posso ir) para olhar tudo lá de cima. O sol se pondo, as nuvens vermelhas e a cidade mansa, como uma criança prestes a dormir.
Ele me disse outro dia que é caído por que nunca foi exímio harpista.


(Esse é pra ler ouvindo "O velho e o moço", do Rodrigo Amarante, Los Hermanos)

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Ar de velho sábio

“Não nos atrasemos com o passado
Não nos antecipemos com o futuro
A vida é um eterno presente”

Eu.

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

eu, eu mesmo e irene

Li, num desses sites de notícias que um psiquiatra tem defendido que o Orkut pode gerar crise de identidade. Acho que ele tem um pouco de razão. O Orkut inovou bastante na maneira de nos relacionarmos. Criamos ali um apanhado de comunidades às quais optamos por participar, convidamos amigos, vasculhamos a vida alheia, enfim, fazemos sem-graçamente sentados à cadeira em frente ao computador o que antes fazíamos pessoalmente. Não, não sou o nem um pouco inovador alarmista que vai dizer que no futuro não sairemos mais de casa, da frente do computador. Não acredito nisso, em definitivo. Sentimos necessidade de nos relacionarmos no bom e velho ao vivo e a cores, de sairmos para vermos o pôr-do-sol, para comemorarmos os nossos aniversários.
O que fiquei pensando (leia-se, viajando) foi, tomando como ponto de partida o termo mídia, como meio, o quanto ainda tomamos a parte pelo todo, a forma pelo conteúdo. Vendo aquelas fotos obrigatoriamente felizes, aquelas pessoas obrigatoriamente sem problemas, não consigo me furtar a um certo estranhamento. De outra maneira, não vai aqui nenhum apelo a um comportamento extremamente oposto. Concordo que seria mórbido demais que todos colocassem no Orkut suas angústias e frustrações. O que me espanta é acreditarmos tanto que somos aquilo ali. Não sou eu quem vai oferecer aqui resposta profunda sobre a essência humana de cada qual, mas das coisas mais divertidas é analisar (mesmo que com uma psicologia de butiquim) o que as pessoas respondem quando o Orkut de maneira soturna e zombeteira, num dado momento nos propõe a pergunta “quem sou eu”. E toma-lhe metamorfoses ambulantes, poesias herméticas, letras de músicas conhecidas ou não. É bem verdade que tem muita gente que não coloca nada, tem gente que é sincero e coloca coisas que nós, que as conhecemos, concordamos e tem outras que colocam várias exclamações, coraçõezinhos e afins.
O Orkut nada mais é do que um meio. Numa viagem mais metafísica, nosso corpo é um meio. Nós não somos os nossos perfis no Orkut assim como não somos o nosso corpo. Tem coisas que somos cá dentro que não cabem em orkuts ou corpos, limitados demais para exteriorizar a natureza de cada um. A gente é que tem que ver se somos parte ou todo.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Eu estava errado


Ao contrário do post anterior, quem me conhece sabe muito bem o quanto é difícil para mim proferir as palavras que estão aí no topo a guisa de título. A questão é que eu poderia jurar que Donatella era a culpada. Quebrei a cara. Depois, tudo pareceu tão óbvio. Era só lembrar da abertura. A pista estava na abertura. Tudo bipartido. Duas versões opostas, duas hisórias opostas. Se a novela começou querendo nos mostrar Donatella como verdadeira culpada e Flora tentando provar sua inocência, nada mais lógico, seguindo a mensagem da abertura, que terminasse com Flora verdadeira culpada e Donatella tentando provar sua inocência. O jogo virou e agora vai ser bastante interessante acompanhar como Flora conseguirá provar uma mentira e como Donatella fará para convencer os outros da verdade.
Fazia tempo que uma novela não prometia tanto.

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Confissões de uma mente perigosa

Devo confessar uma coisa. Muita gente vai dizer que já desconfiava, eu sei. Na verdade eu nunca fiz muita questão de esconder, só evitava comentar. Não é o tipo de coisa que se assume assim, impunemente, aos quatro ventos, por isso sempre mantive a discrição e saibam que, se hoje confesso aqui, abertamente, não será sem uma certa dose de constrangimento, mas é que acho que o comentário vem tanto a calhar que fiquei empolgado de dividir isso com meus virtuais e silenciosos leitores.
Eu vejo novela. Eu sei que depois dessa frase qualquer coisa que eu disser para dimensioná-la vai parecer uma tentativa desesperada e mentirosa de disfarçar uma compulsão irresistível, mas vá lá: Não assisto todas as novelas. No momento, somente “A favorita” é que vem despertando meu interesse. De fato, nas outras eu não sei nem o que vem se passando, mas “A favorita” eu resolvi, desde o inicinho, acompanhar. Uma história mal contada no passado, personagens ambíguas e motivos de sobra para acreditar tanto na versão de uma como da outra, foram idéias que me seduziram desde antes da novela estrear, com uma monumental chamada das duas protagonistas dizendo a mesma história ao mesmo tempo. Depois, o que me conquistou foi o título, uma remissão aos antigos folhetins recheados de melodramas de cortar os pulsos. E, para arrematar, uma abertura simples mas bastante eficiente com uma trilha sonora tango-eletrônica impossível de não se gostar e querer ouvir de novo. Agora, o que particularmente me conquista é o elenco feminino. Cláudia Raia é a melhor Donatella que poderia haver, Patrícia Pillar empresta uma dignidade e uma dubiedade a Flora que jamais outra atriz conseguiria e Mariana Ximenes, completando o trio, além de ser o pitéu que é, conseguiu estabelecer uma química bacana com as duas e ainda com Mauro Mendonça e Glória Menezes, esses já imunes a qualquer crítica negativa. Outra que vale a pena mencionar é Lília Cabral, apesar dela não integrar o núcleo principal. É impressionante a veracidade que ela consegue emprestar a sua sofrida e submissa personagem, que igualmente me cativou de primeira. A novela tem muita bola fora também. Em dados momentos, principalmente nos de tensão, sinto falta de uma boa briga escrita por um Gilberto Braga, por exemplo, mas nada que retire a excelência de um João Emanuel, até por que tentar barrar Gilberto Braga nesse quesito é missão quase impossível.
Aqui, uma pequena digressão. Gilberto Braga escreveu um das cenas mais contundentes de conflito de gerações que já vi na televisão. É uma cena do seriado “Anos Rebeldes” em que Cláudia Abreu e José Wilker contracenam. Ela, a filha guerrilheira em 1969 que estava na luta armada há mais de um ano sem o pai saber e ele o pai magnata que só pensava em ganhar dinheiro. Não é pela questão política, mas a construção emocional dos personagens, que me impressiona. Veja um pedaço desta cena neste link : (http://www.youtube.com/watch?v=MYpSD1OZvuc) E acredite que o melhor desta cena não está aí. O melhor do seriado não está aí. Está nas discussões entre Maria Lucia (Malu Mader) e João Alfredo (Cássio Gabus Mendes), na trilha sonora, no Galeno provocando o cunhado militar com frases tiradas de versos da música popular brasileira da época...
Voltando à Favorita, está marcada uma grande guinada na história para amanhã. Comento após.