Eu impliquei com este filme até onde pude. E quando resolvi baixar a guarda, vi o burro que fui. Por mais que admirasse os trabalhos de Danny Boyle, achei pretensioso demais um inglês querer falar da durarealidade indiana. Soava para mim quase que como um sermão do Papa em favor das inumeráveis vítimas da Inquisição. Ok, peguei pesado, eu sei, mas é um pouco por aí. E, pior dos anátemas, implicava com o filme sem tê-lo visto. E olha que ainda tinha também as incontáveis opiniões respeitáveis a favor.
Mas pelo bem de todos e pela vontade geral da nação, hoje assisti “Slumdog Millionaire” (mal traduzido na epígrafe e adaptado para o sofrível e quilométrico “Quem quer ser um milionário?”).
A história de Jamal, um pobre servidor de chá numa empresa de call center indiana, que ganha 20 milhões de rúpias em um programa no melhor estilo “Show do Milhão” (com jingle bem parecido, inclusive) já vale ser contada por si só, mas o filme não é só isso. Na verdade, este é o pano de fundo para uma açucarada, sim, melosa, sim, porém deliciosa história de amor.
As mazelas sociais da Índia estão presentes tanto nas favelas, nossas velhas conhecidas, quanto nas piadas sarcásticas do apresentador do programa em relação ao humilde participante (aliás, se o filme fosse brasileiro eu poderia dizer que o ator fez escola com Silvio Santos, para o bem e para o mal) e este é, sim, um dos focos do filme que -“hare baba!”- desemente toda aquela parafernalha fake da novela das oito.
Mas este contexto não deixa de ser um pano de fundo para a odisséia de um grande amor. O de Jamal e Latika. Quando disse acima que era açucarada e melosa, quis dizer não no sentido novela-mexicana do termo, mas no sentido Álvaro de Campos, quando diz que as cartas de amor são ridículas . Não dá para falar de amor sem ser piegas, ridículo, assim como não dá para falar de um grande amor sem que haja obstáculos, sem que haja obstinação do mocinho em ficar com a mocinha. Mocinha que, como em qualquer história de amor, encontra-se na mão de bandidos poderosos e que Jamal tem que dar um jeito de salvar. E desde muito pequeno é o que ele decide-se por fazer. Os detalhes da história, saiba pelo filme.
De resto, só posso adiantar que a direção tem o selo Danny Boyle de qualidade. Que a montagem é bem feliz e que o filme tem um quê de ‘Cidade de Deus’, sim, mas daí a dizer que é plágio vai uma looooonga distância. A opção por narrativas paralelas do passado e presente/futuro do personagem só nos faz entender cada vez mais quem era o grande sortudo(?) daquela noite e como aquilo tudo era tão estranho e maravilhoso para ele, fazendo com que nos sintamos não só como aqueles milhares de indianos grudados na TV no dia da grande final, como o próprio Jamal.
Vale a pena ver o primeiro trecho dos créditos finais.
quarta-feira, 22 de julho de 2009
segunda-feira, 20 de julho de 2009
Harry Potter e o Engima do Príncipe
Fui assistir acompanhado de uma amiga que havia acabado de reler o livro. Ela disse que ficou faltando muita coisa e que, inclusive, alguns detalhes importantes foram solenemente ignorados- e repudiava qualquer tentativa minha de contra-argumentar dizendo que “Foi uma adaptação!”.
Como eu não estava mais tão contaminado do livro, pude assistir este “Harry Potter e o enigma do príncipe” realmente como um filme. É óbvio que um detalhe ou outro eu lembrava, o que pode ter, de alguma forma, facilitado no entendimento da história, mas de uma maneira geral, gostei do resultado e acho que, quem conhece razoavelmente as aventuras do jovem bruxo, consegue acompanhar este filme sem grandes dificuldades.
Lembro dos primeiros filmes que eram quase cópias fiéis dos livros, mas que não conseguiam capturar as magias das aventuras. Os livros eram sempre infinitamente melhores. Ok, o livro sempre é melhor, mas é possível fazer boas adaptações como, por exemplo “O leitor”, “O Jardineiro Fiel” e os últimos do próprio Harry Potter.
Não basta só um roteiro coeso, enxuto, mas, principalmente bem filmado. E acho que este é um mérito dos últimos filmes da franquia do qual este não é exceção.
O filme começa já com uma cena que não lembro de ter lido no livro. Harry passando uma cantada numa garçonete. Prenúncio da temática central pela qual se optou neste episódio. A explosão hormonal-afetiva dos 15-16 anos.
Os encontros e desencontros amorosos dos personagens, é verdade, receberam uma maior atenção do que a saga de Harry para descobrir quem era o príncipe mestiço e a verdade sobre Lord Voldemort, mas, mesmo assim, ficou muito bacana de se ver. Sensível e engraçadinho, mas também sério e comovente nas horas certas, como deve ser.
Para mim, a excelência deste filme se basta por duas cenas. A que Dumbledore salva Harry dos Inferi com um feitiço grandioso envolvendo imensas labaredas de fogo (o filme anterior já evidenciara a grandeza do mago em sua luta contra Voldemort no Ministério da Magia, mas esta cena é ainda mais simbólica) e a que todos os bruxos de Hogwarts empunham a varinha em meio às trevas dissipando as nuvens negras no céu em homenagem a um fato que não quero spoilar.
O elenco, mais uma vez, colabora e muito para a magia do filme. Destaque para Rupert Grint, o Ronny Weasley, comediante nato. As cenas em que ele é enfeitiçado por engano por uma poção do amor são impagáveis, principalmente aquelas passadas dentro do gabinete do Professor Slughorn.
Jim Broadbent, aliás, está igualmente irresistível como o afetado e elitista, mas não menos carismático, professor. Michael Gambon deu largas mostras de que foi o perfeito sucessor de Richard Harris no papel de Alvo Dumbledore e Maggie Smith, apesar das poucas aparições segue firme e cativante como Minerva McGonagall. Isso sem falar em Alan Rickman, eterno Severo Snape e em Helena Bonham Carter como a histérica e medonha Belatriz Lestrange.
Gostaria de mencionar ainda o mais importante trio da série. Harry, Rony e Hermione (sempre citados nesta ordem nos livros, lembram?). Daniel Radcliffe, Rupert Grint e Emma Watson, além de terem se tornado jovens adultos de invejável beleza (e conta bancária) emprestam singular verossimilhança a seus personagens. Talvez por terem passado grande parte de suas vidas até agora juntos, mas talvez também pelo talento, por que não? Dan arrancou elogios de exigentes público e crítica teatrais do Reino Unido e dos EUA com a peça “Equus”, Rupert tem uma veia cômica inegável e Emma foi recentemente aceita para Universidade de Yale. Essa galerinha (já não mais tão “inha” assim) certamente vai longe.
Algo me diz que o sétimo e último filme da franquia será retumbante. Não deve ser por acaso que as cenas de ação que o sexto livro já trazia não foram mostradas. E boatos cada vez mais fortes garantem que as últimas aventuras do jovem bruxo (Harry Potter e as relíquias da morte) será divida em duas partes.
terça-feira, 14 de julho de 2009
"...a vida é uma história contada por um idiota, cheia de som e fúria, e que não significa nada"
Arrisco uma previsão. Assim como a procura por aulas de dança de salão aumentou bizarramente após a dança dos famosos, a procura por cursos de teatro aumentará (ok, talvez não na mesma proporção) após “Som e fúria”. Não foram poucas vezes, nesta uma semana de minissérie, que eu me vi acalentando esta fantasia. Ela não é exatamente nova e não está necessariamente restrita a esta ocasião, mas o seriado a trouxe novamente a tona com mais cores de possibilidade.
Mais do que oferecer ao público um texto inteligente e um naipe de atores invejável, creio que este seriado contribuirá enormemente para uma retomada de valorização do teatro. O que as telenovelas ganham com o atacado dos inumeráveis capítulos e atrativas compensações comerciais, perde com o varejo dos detalhes e do prumo artístico de suas produções. Obviamente, ressalva-se as devidas exceções para um e outro lado.
O capítulo de hoje foi simplesmente primoroso. Estão encenando Hamlet (que é, para mim, até este momento da minha vida, a peça das peças). Daniel Oliveira interpreta o galã de novela chamado para interpretar o melancólico e irado príncipe da Dinamarca. Ninguém acredita nele por que até então ele tem o inacreditável hábito de inserir gírias contemporâneas totalmente inadequadas ao texto e também esquece as falas, quando não as reinventa confundindo o restante do elenco. Aí, eis que, de repente, ele encarna Hamlet fingindo-se louco e mandando Ofélia ao convento. Foi uma cena bonita. Dessas que só atores como Daniel Oliveira conseguem fazer. O cara que reencarnou Cazuza.
Outra que me seduz toda vez que está em cena é Andréa Beltrão. Ela tem essa presença imune a qualquer indiferença. Aquilo que as pessoas chamam de brilho, de carisma, magnetismo. Lembro do Fernando Meirelles escrevendo no blog de “Ensaio sobre a cegueira” sobre a Julianne Moore. Aposto que escreveria a mesma coisa sobre Andréa Beltrão. Faz toda a diferença se a cena é com ela, ou não.
Isso porque ainda tem Maria Flor, Pedro Paulo Rangel, Felipe Camargo, Chris Couto e Regina Casé. Esta nos deixando com a reflexão do quanto estamos perdendo com as suas bissextas aparições como atriz, não desvalorizando seu talento para os outros trabalhos que realiza, obviamente. Paulo Betti apareceu quase que como um figurante no capítulo de hoje. Promessa de ainda vem muita coisa boa por aí.
Mais do que oferecer ao público um texto inteligente e um naipe de atores invejável, creio que este seriado contribuirá enormemente para uma retomada de valorização do teatro. O que as telenovelas ganham com o atacado dos inumeráveis capítulos e atrativas compensações comerciais, perde com o varejo dos detalhes e do prumo artístico de suas produções. Obviamente, ressalva-se as devidas exceções para um e outro lado.
O capítulo de hoje foi simplesmente primoroso. Estão encenando Hamlet (que é, para mim, até este momento da minha vida, a peça das peças). Daniel Oliveira interpreta o galã de novela chamado para interpretar o melancólico e irado príncipe da Dinamarca. Ninguém acredita nele por que até então ele tem o inacreditável hábito de inserir gírias contemporâneas totalmente inadequadas ao texto e também esquece as falas, quando não as reinventa confundindo o restante do elenco. Aí, eis que, de repente, ele encarna Hamlet fingindo-se louco e mandando Ofélia ao convento. Foi uma cena bonita. Dessas que só atores como Daniel Oliveira conseguem fazer. O cara que reencarnou Cazuza.
Outra que me seduz toda vez que está em cena é Andréa Beltrão. Ela tem essa presença imune a qualquer indiferença. Aquilo que as pessoas chamam de brilho, de carisma, magnetismo. Lembro do Fernando Meirelles escrevendo no blog de “Ensaio sobre a cegueira” sobre a Julianne Moore. Aposto que escreveria a mesma coisa sobre Andréa Beltrão. Faz toda a diferença se a cena é com ela, ou não.
Isso porque ainda tem Maria Flor, Pedro Paulo Rangel, Felipe Camargo, Chris Couto e Regina Casé. Esta nos deixando com a reflexão do quanto estamos perdendo com as suas bissextas aparições como atriz, não desvalorizando seu talento para os outros trabalhos que realiza, obviamente. Paulo Betti apareceu quase que como um figurante no capítulo de hoje. Promessa de ainda vem muita coisa boa por aí.
quinta-feira, 2 de julho de 2009
a próxima fase
Volta e meia me pego querendo entender as pessoas. As coisas se me escapam com igual fugacidade. Nada é feito só para entender, reflito, mas para ser olhado em perspectiva. Muitas questões estão em jogo e o simples entendimento é cego para muitas delas. É preciso sentir. Mais imperioso que qualquer tratado sobre tudo ou sobre porra nenhuma. É imperioso sentir. Sentir muito. Sentir muitíssimo porque qualquer automatismo, qualquer coisa que nos tire vida, nos tire autonomia, é contra a nossa natureza traidora, sempre errante, sempre nômade em seu descontentamento transcendental.
Se tento aprisionar um sinal fechado, um olhar cansado, um gesto de gentileza, todos se esvaem em grãos miúdos pelo buraco fino da ampulheta, mas, por algum desses mistérios insondáveis da vida, continuam a circular aqui dentro. E eu mastigo todos eles. Deles me alimento. Regurgito. Cuspo um pouco. (Por que sentir muitíssimo também pode fazer mal aos estômagos frágeis). E eu me nutro desses ecos de impermanência como um adicto em heroína. E como em qualquer vício, a delícia tem prazo de validade. Uma crise de abstinência se me impõe para que saia tudo de suspensão e eu passe para a próxima fase. Mais rico, mais múltiplo, mais alto.
Se tento aprisionar um sinal fechado, um olhar cansado, um gesto de gentileza, todos se esvaem em grãos miúdos pelo buraco fino da ampulheta, mas, por algum desses mistérios insondáveis da vida, continuam a circular aqui dentro. E eu mastigo todos eles. Deles me alimento. Regurgito. Cuspo um pouco. (Por que sentir muitíssimo também pode fazer mal aos estômagos frágeis). E eu me nutro desses ecos de impermanência como um adicto em heroína. E como em qualquer vício, a delícia tem prazo de validade. Uma crise de abstinência se me impõe para que saia tudo de suspensão e eu passe para a próxima fase. Mais rico, mais múltiplo, mais alto.
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