quarta-feira, 26 de março de 2008

de onde vem a calma

"e no final assim, calado,
eu sei que vou ser coroado rei de mim"

MC-LH (de onde vem a calma)

A chuva leva bastante sujeira para as ruas. Além de tingir tudo de prateado, ela faz com que as pessoas tenham menos paciência, andem mais rápido, se esbarrem com mais violência. Os meus sapatos me apertam. Engraxei-os hoje pela manhã e já estão irreconhecíveis. Procuro não me importar com isso. A temperatura está mais amena que ontem, mas não o suficiente para tornar confortável andar pelas ruas com terno e gravata. Sinto um pouco de falta de ar. Seguro um guarda-chuvas vacilante.
Sinto-me como que observado, como que cobrado. Não sei quando nem porquê fiquei sério, assim, frio. A vitrine repleta de televisores me exige alegria e eu também. Mas não de uma forma espontânea. De uma forma violenta, que dói no peito, contra a vontade, e que invariavelmente disfarço, com certo cinismo. Mas os olhos não mentem. Natália sabia disso muito bem e era a pessoa que mais sabia ler meus olhos. Eu não conseguia mentir para ela, mas ela conseguia mentir para mim. E para ela também. Pensar na Natália me dá fome. Fome, não, apetite. Vontade de fazer amor com ela repetidas vezes depois de brigar. Ouvir os suspiros dela no meu ouvido e me sentir vingado. Só que ela sabia ler meus olhos e via o que eu não queria e também o que eu não sabia, como se eles fossem uma bola de cristal. Ela disse que descobriu que não era a mulher certa para mim e bateu a porta. Nunca vou me esquecer dos cabelos dela balançando ao fazer isso. É a imagem que ainda tenho daquele dia. Tinha urgência naqueles cabelos. Vontade de fugir. Os cabelos dela me magoaram profundamente. E o reflexo do sol da manhã que vinha deles rapidamente se desfiguraram na mesma hora da dor na garganta e da vontade de gritar. Por que eu não sabia de quem tinha sido a culpa.
Pensar nisso pesa o corpo e ainda tenho dois quarteirões para atravessar. Com poças d´água e pessoas bufando na calçada estreita.
A chuva aperta. A parte baixa da calça do meu terno já está um pouco molhada e a parte de trás, com pontinhos brancos da poeira da chuva. Ando mais rápido e balanço a cabeça para arrumar os pensamentos.

Um comentário:

Fabiana Mendonça disse...

Fiquei curiosa pra saber quem te expirou Natália!hahaha...
Continue escrevendo! Prometo entrar no seu blog, sempre que der.Agora vc já tem um leitor garantido!! O que te faltou foi propaganda!rsrsrs..
Beijooooo